quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

3

O nome dela era Aline.
fomos até a delegacia....emprestei minha jaqueta para ela poder cobrir o seu corpo. Ela tremia e se segurava forte em mim, como se algo terrível fosse acontecer se ela me largasse.
Entramos na delegacia, ela quase não conseguia falar em meio aos choros, atenderam ela e me fizeram uma série de perguntas. Com certeza os policiais não foram com minha cara - Estava meio bêbado, todo sujo, sem sapatos... Após toda a burocracia, eu a levei embora. Ela já estava mais tranqüila e calma. O sol surgia tímido no horizonte, eu havia perdido a hora, o efeito do vinho saia aos poucos do corpo, deixando em seu lugar as dores e castigos que antes eram imperceptíveis....estava muito cansado e precisava descansar.
Decidi acompanhar Aline até sua casa de ônibus, no caminho tentei puxar uma conversa mais informal para deixar ela mais calma e para me distrair das dores que sentia. Consegui arrancar breves sorrisos dela com frases bobas e ensaiadas que costumo usar para quebrar o gelo em conversas com desconhecidos.
Desci do ônibus e a deixei na frente de um condomínio, ela me disse que morava com seus pais, mas eles estavam viajando no momento. Pediu para eu entrar e descansar um pouco. Eu exitei, estava em um estado deplorável, fedendo, machucado e com uma terrível dor de cabeça, como se uma bigorna estivesse a achatando - Mas também não estava em condições de chegar até em casa - Acabei por aceitar o convite.
Ela sorriu e pareceu bem animada com isso.

Era um ambiente familiar, cor bege predominante. Com certeza os pais dela tinham dinheiro e ela tinha uma vida boa. Enquanto entravamos, ela falava coisas da vida dela, sobre os pais, sobre tudo, mas eu só lembro até a hora que sentei no sofá.
Tive um sonho estranho, visões de uma pessoa usando um manto negro rasgado que cobria todo o seu corpo, possuía dois pares de longas asas negras - Uma sensação de mal estar terrível me abatia.
Acordei, a dor de cabeça ainda martelava em minha cabeça, e ainda mais forte do que eu me lembrava. Fiquei perdido por cerca de três segundos até me situar de onde estava e de tudo que havia acontecido na noite anterior. Resolvi ligar meu celular que eu havia desligado. Como é curioso, você nunca recebe ligações ou mensagens, mas quando desliga o celular, parece que o mundo inteiro quer falar com você. Havia ligações da minha mãe, uma mensagem do Douglas - um amigo meu do cursinho. Ele pediu por que não apareci na aula de ontem. Haviam ligações muitas pessoas , inclçuindo até a operadora de celular oferecendo promoções. Eu esperava ver alguma mensagem ou ligação da Dominique...mas não havia.
Fui me levantar, e percebi que estava...nu, coberto apenas por um cobertor da hello Kitty. Meus machucados estavam limpos e com curativos. Num movimento para me por de pé, acabei derrubando uma xícara de chá que estava ao lado do sofá num criado mudo. Aline veio as pressas como se ouvisse alguém chamar o seu nome.
_Você acordou! Não se preocupe, eu limpo tudo.
Ela saiu voando até a dispensa e voltou com uma pá e uma vassourinha, ela era muito rápida, como aqueles robôs faxineiros de filmes de ficção-científica.
_Não precisa se incomodar comigo... Não quero dar trabalho...
_Que isso, você salvou minha vida. Serei eternamente grata...hi, hi, hi...
Notei que a face dela ficava rubra, ela tinha um sorriso leve no rosto e seu olhar ficava em dúvida se me fitava ou não...então notei que não estava me cobrindo com a coberta.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

2

Voltando a fatídica noite do fim.
Aquela noite eu não voltei pra casa....Sentia que não havia espaço para mim lá e para tudo que rondava minha mente, resolvi espairecer por ai. Comprei uma garrafa de vinho barato em um boteco de quinta categoria, sai pelas ruas da cidade bebendo sem direção. Não me importava com mais nada, nada mesmo, queria apenas que aquela angústia que me destruía acabasse de uma vez por todas e nada mais.
Sem rumo, fui bebendo e cambaleando pelos cantos. Nunca fui de beber encher a cara, nunca havia feito isso antes. Sempre considerei bebida algo para sociabilizar com amigos, não para passar da conta...mas eu buscava naquela garrafa o conforto e solução que ninguém mais poderia me dar. Aos poucos a bebida foi me entorpecendo...fui perdendo a noção do que era real...As cores já não eram mais as mesmas, o horizonte não era linear....Enfim, era como se meu corpo não seguisse mais meus comandos.
Talvez os fatos que eu narre agora estejam fora de nexo e sentido, mas é a forma que me recordo pelo estado em que estava.
Um homem chegou parto de mim:
_E ai magrão! tem fogo?
_Não, eu não fumo
_Então me passa uma grana ai meu!
Ele estava ficando irritado, mas não parecia estar em estado melhor que o meu, não lembro o que eu falei, mas sei que entramos numa briga. Logo após isso...eu acordei caído no chão, verifiquei se minha carteira estava no bolso e estava, mas tinha dificuldade pra me erguer - As únicas coisas que não estavam comigo eram a garrafa e meus tênis.
Ao me erguer, escutei um barulho estranho...o efeito do álcool já estava passando. Observei dois homens encima de uma garota, eles estavam batendo nela e tentando estuprá-la. Pelo jeito não ligaram para um garoto caído no chão. Eu primeiramente decidi não interferir...não era comigo...estas coisas acontecem...mas fui ouvindo os gritos dela de socorro...e logo imaginei se isso acontecesse com a Domi. Parei de raciocinar, agarrei um pedaço de cano caído no chão e corri pra cima deles, desferindo um golpe certeiro na nuca de um que caiu ensangüentado no chão. O outro ficou sem reação, eu ameacei acertá-lo e ele agarrou o outro e saiu correndo gritando coisas como "Você vai pagar herói!", “isso não fica assim!"
Eu larguei o cano, olhei para a garota, ela estava encostada na parede, tremia e chorava copiosamente segurando os trapos que antes eram a sua roupa. Ela tinha cabelos loiros, estava com alguns machucados pelo corpo.
Eu estendi a mão pra ela e disse:
_Venha, vamos para delegacia.
Ela se levantou e chorando se abraçou em mim.
Decidi que a levaria para prestar queixa, e depois tudo acabaria...ledo engano...

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

1

Anjo
Era assim que meus colegas me chamavam na época de escola. Minha mãe gostava de deixar meus cabelos castanhos crescerem como os de um querubim...Hoje, aos 18 anos, uso o cabelo raspado bem baixo para compensar. Eu detestava os apelidos idiotas que recebia (e por isso os recebia), poucas pessoas me chamavam pelo nome - Arthur. Eu sempre gostei deste nome, me lembrava às histórias do Rei Arthur e da Távola redonda - Que foi de onde meus pais tiraram o nome.
Morava em uma cidade do interior, e a 1 ano me mudei para Porto Alegre querendo fazer cursinho pra passar na UFRGS. Foi no cursinho que a conheci, Dominique. Lembro o primeiro dia, fui o primeiro a chegar na sala de aula, logo vieram muitas e muitas pessoas, e eu ao lado da janela, como fazia no tempo de escola. A aula havia começado, e do nada, três batidas na porta anunciam a chegada dela, uma garota de altura mediana, cabelos ruivos e brilhantes, pele clara com sardas nos locais exatos. Um sorriso encabulado e um olhar de cachorrinho sem dono para o professor - Assim como qualquer outra pessoa, o professor concedeu perdão àqueles olhos verde esmeralda, ela sabia que este olhar nunca falhava. Ela desfilou pela sala com sua blusa branca e calça jeans, e se sentou atrás de mim, à única carteira livre.
Ela me cutucou e pediu emprestada uma caneta, emprestei a minha vermelha. Ela pagou esta boa ação com um sorriso de diamante e disse: "Obrigada, me chamo Dominique". Eu perdi um segundo admirando aquele instante e gaguejando respondi: "o p-prazer é meu, me chamo A-Arthur". Ela sorriu e disse: "hi! hi! Prazer A-Arthur". Eu sempre fiquei nervoso em situações como esta, com garotas bonitas. Minhas mãos suam e tremem, meus estomago fica como se estivesse oco, eu tropeço nas palavras.
Na finalidade de aprendizagem aquela aula foi um lixo, mas na finalidade de relacionamento foi perfeita. Dominique me cutucava a cada 5 minutos para conversar ou pedir algo, e no fim da aula, ela pegou a minha mão e escreveu o numero de seu telefone com minha caneta vermelha, dizendo: "Me liga pra gente combinar algo A-Arhur, hi! hi!" Nunca fui forte nem fraco, nem gordo e nem magro, me misturo facilmente na multidão, será que foi apenas a dama da sorte que pós ela em minha vida e fez com que eu a conhecesse?
Aquele dia eu a conheci, após três semanas nós começamos a namorar. Engraçado...isso faz mais de um ano...mas pra mim é como se fosse ontem...Como a memória é traiçoeira, nos fazendo sentir saudade das coisas que perdemos.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

PRÓLOGO

"FIM!"
Fim.
E foi assim que tudo acabou entre nós naquela antes maravilhosa tarde de verão. Dominique dava as costas pra mim com lagrimas em seus olhos verde como jade, e disparava a correr, seus cabelos vermelho escarlate se lançando ao vento. O que levou três semanas para se consolidar como relacionamento foi destruído com apenas três letras. Eu entreguei meu coração a ela, e quanto mais ela se afastava de mim, senti meu peito se dilacerar. Mesmo após o pôr-do-sol, ainda não havia acreditado, havíamos brigado várias vezes antes, mas desta vez algo me disse que seria diferente das outras - que era definitivo.
Já era noite enquanto andava até o ponto de ônibus, tentava entender o que havia acontecido, porquê ela teria acabado comigo, porquê tivemos aquela discussão. Confesso, não era o namorado perfeito, muitas vezes pensei mais em mim do que nela, mas nunca fiz nada de errado que não pudesse ser perdoado. Ela disse "não te amo mais" assim como quem diz "vou cancelar a assinatura do jornal". Eu conheço a Domi, sei de todos os seus defeitos e qualidades, mas esta atitude foge do padrão dela - por quê?
Para mim o mundo havia acabado, e eu pensei que este acontecimento era o pior que poderia acontecer áquela noite, aquela fatídica noite - Como estava enganado.
Você deve estar pensando que uma história que começa com FIM não deve ser uma história comum, e de fato, digo a você que minha história não é nem um pouco comum.
 
Creative Commons License
Requiem da Meia-Noite by Ródjer Goulart is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 2.5 Brasil License.