quinta-feira, 26 de março de 2009

14

Réquiem
I. Introitus
Requiem aeternam dona eis, Domine, Repouso eterno dá-lhes, Senhor
Et lux perpetua luceat eis. E luz perpétua os ilumine
Te decet hymnus, Deus, in Sion, Tu és digno de hinos, ó Deus, em Sião
et tibi reddetur votum in Jerusalem: E a ti rendemos homenagens em Jerusalém:
Exaudi orationem meam, Ouve a minha oração,
ad te omnis caro veniet. Diante de Ti toda carne comparecerá
Requiem aeternam dona eis, Domine, Repouso eterno dá-lhes, Senhor
Et lux perpetua luceat eis. E luz perpétua os ilumine

II. Kyrie
Kyrie eleison. Senhor, tem piedade
Christe eleison. Cristo, tem piedade
Kyrie eleison. Senhor, tem piedade

III. Sequentia
1 - Dies irae
Dies irae, dies illa Dia de ira, aquele dia
Solvet saeclum in favilla No qual o mundo se tornará em cinzas
Teste David cum Sibylla Assim testificam Davi e Sibila
Quantus tremor est futurus, Quanto temor haverá então,
Quando judex est venturus, Quando o Juiz vier
Cuncta stricte discussurus. Para julgar com rigor todas as coisas.

2 - Tuba mirum
Tuba mirum spargens sonum A trombeta poderosa espalha seu som
Per sepulcra regionum, Pela região dos sepulcros,
Coget omnes ante thronum. Para juntar a todos diante do trono.

Mors stupebit et natura A morte se espantará, como a natureza
Cum resurget creatura, Com as criaturas que ressurgem,
Judicanti responsura. Para responderem ao juízo.

Liber scriptus proferetur, Um livro será trazido,
In quo totum continetur, No qual tudo está contido,
Unde mundus judicetur. Pelo qual o mundo será julgado.

Judex ergo cum sedebit, Logo que o juiz se assente,
Quidquid latet apparebit: Tudo o que está oculto, aparecerá:
Nil inultum remanebit. Nada ficará impune.

Quid sum miser tunc dicturus? O que eu, miserável, poderei dizer?
Quem patronum rogaturus, A que patrono recorrerei,
Cum vix justus sit seccurus? Quando apenas o justo estará seguro?

3 - Rex tremendae
Rex tremendae majestatis, Ó Rei, de tremenda majestade,
Qui salvandos salvas gratis, Que ao salvar, salva gratuitamente,
Salva me, fons pietatis. Salva a mim, ó fonte de piedade.

4 - Recordare
Recordare, Jesu pie, Lembra-te, ó Jesus piedoso,
Quod sum causa tuae viae, Que fui a causa de tua peregrinação,
Ne me perdas illa die. Não me perca naquele dia.

Quaerens me, sedisti lassus Procurando-me, ficaste exausto
Redemisti Crucem passus Me redimiste morrendo na cruz
Tantus labor non sit cassus. Que tanto trabalho não seja em vão.

Juste judex ultionis, Juiz de justo castigo,
Donum fac remissionis Dai-me o dom da remissão
Ante diem rationis Antes do dia da razão

Ingemisco tamquam reus Choro e gemo como um réu
Culpa rubet vultus meus A culpa enrubesce meu semblante
Supplicanti parce, Deus. A este suplicante poupai, ó Deus.

Qui Mariam absolvisti, Tu, que absolveste a Maria,
Et latronem exaudisti E ao ladrão ouviste,
Mihi quoque spem dedisti. A mim também deste esperança.

Preces meae non sunt dignae Minhas preces não são dignas
Sed tu bonus fac benigne, Sê bondoso e faça misericórdia,
Ne perenni cremer igne. Que eu não queime no fogo eterno.

Inter oves locum praesta Dai-me lugar entre as ovelhas
Et ab haedis me sequestra E afastai-me dos bodes
Statuens in parte dextra. Que eu me assente à Tua direita.

5 - Confutatis
Confutatis maledictis Condenados os malditos
Flammis acribus addictis E lançados às chamas devoradoras
Voca me cum benedictis Chama-me junto aos benditos

Oro supplex et acclinis Oro, suplicante e prostrado
Cor contritum quasi cinis O coração contrito, quase em cinzas
Gere curam mei finis. Tomai conta do meu fim.

6 - Lacrimosa
Lacrimosa dies illa Dia de lágrimas será aquele
Qua resurget ex favilla No qual os ressurgidos das cinzas
Judicandus homo reus. Serão julgados como réus.

Huic ergo parce, Deus A este poupa, ó Deus
Pie Jesu Domine Piedoso Senhor Jesus
Dona eis requiem, Amen. Dá-lhes repouso. Amém.

IV. Offertorium
1 - Domine Jesu Christe
Domine Jesu Christe, Rex gloriae, Senhor Jesus Cristo, Rei da Glória
Libera animas omnium fidelium defunctorum Liberta as almas de todos os que morreram fiéis
de poenis inferni et de profundo lacu: das penas do inferno e do lago profundo:
Libera eas de ore leonis, Libertai-as da boca do leão
Ne absorbeat eas tatarus, ne cadant in obscurum: Que não sejam absorvidas no inferno, nem caiam na escuridão:
Sed signifer sanctus Michael repraesentet eas in lucem sanctam: Mas que o arcanjo santo Miguel as introduza na luz santa:
Quam olim Abrahae promisiti et semini ejus. Conforme prometeste a Abraão e à sua descendência.

2 - Hostias
Hostias et preces tibi, Domine, laudis offerimus: Sacrifícios e preces a Ti, Senhor, oferecemos com louvores:
Tu suscipe pro animabus illis, Recebe-os em favor daquelas almas,
quarum hodie memoriam facimus: Das quais hoje nos lembramos:
Fac eas, Domine, de morte transire ad vitam. Fazei-as, Senhor, da morte passarem para a vida.
Quam olim Abrahae promisisti et semini ejus. Conforme prometeste a Abraão e à sua descendência.

V. Sanctus
Sanctus, Sanctus, Sanctus Dominus, Deus Sabaoth. Santo, Santo, Santo, Senhor Deus dos Exércitos.
Pleni sunt coeli et terra gloria tua. Cheios estão os céus e a terra da Tua glória
Hosanna in excelsis. Hosana nas alturas.

VI. Benedictus
Benedictus, qui venit in nomine Domini Bendito o que vem em nome do Senhor
Hosanna in excelsis. Hosana nas alturas.

VII. Agnus Dei
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi: donna eis requiem. Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo, dai-lhes o repouso.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi: donna eis requiem sempiternam. Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo, dai-lhes o repouso eterno.

VIII. Communio
Lux aeterna luceat eis, Domine: Que a luz eterna os ilumine, Senhor:
Cum Sanctis tuis in aeternum: quia pius es. Com os teus santos pela eternidade: pois és piedoso.
Requiem aeternam dona eis, Domine: Repouso eterno dá-lhes, Senhor:
Et lux perpetua luceat eis. E que a luz perpétua os ilumine.
Cum Sanctis tuis in aeternum: quia pius es. Com os teus santos pela eternidade: pois és piedoso.

(Fonte: Wikipédia)

13

Crepúsculo!
O pôr-do-sol no Guaíba é uma das imagens mais belas que já vi em minha vida. È um daqueles fenômenos naturais que você quer guardar em uma caixinha para poder ver sempre que quiser. O chato de coisas como esta, é que lembram momentos de nossas vidas, eu sempre vinha aqui com a Domi quando estávamos juntos, e querendo ou não, sinto um aperto no peito toda vez que vejo algo que remete aquela época.
As horas foram passando rapidamente, e a olhos nus, o sol descia até ser tragado pelas águas, deixando apenas o manto da noite, que naquela noite, não estava estrelada. Fiquei ali sentado, sem vontade de sair, como se não possuísse necessidade alguma em minha vida, como se aquele instante fosse parte do infinito, e pudesse ficar ali como uma estátua. Minha mente estava vazia e em nada pensava, apenas a sensação de serenidade e tranqüilidade se espalhava por todo o meu corpo – talvez tenha chegado ao nirvana naquele momento. Porém já era noite, e aos poucos minha percepção foi voltando para meu redor. A iluminação estava precária, carros passavam vez ou outra e as poucas pessoas que caminhavam por ali não pareciam ser nada amistosas.
Levantei-me com dificuldade pelo tempo que fiquei ali, meus membros formigavam, olhei para o relógio e já passava das dez da noite. Estranhamente eu não sentia fome nem nenhuma outra vontade do corpo. Não queria ir pra casa, sabia que a mesma solidão de todas as noites me esperava lá, e eu nunca sinto sono antes da meia-noite. Tentei ligar para alguns dos meus amigos, quem sabe poderíamos pensar em algo para nos divertir...mas dos poucos que atenderam, nenhum estava disponível. Pensei em ligar pra Domi, mas achei melhor não. Liguei para Aline, mas o celular dela estava desligado. Fico furioso quando tento ligar para uma pessoa e seu celular não esta ligado na maior parte das vezes, ora! Se possuir um celular, deixe-o sempre ligado e carregado, nunca se sabe quando alguém pode precisar ligar para você!
Esta sucessão de ligações e frustrações acabou me dando fome, decidi me dirigir mais para o centro e comer algum “morte lenta” de esquina – chamamos os cachorros quente de morte lenta pelo conhecido dano que essas coisas causam em nossa saúde, mas cá entre nós, nada melhor que um bom “dog completo” feito numa carrocinha de esquina. Paguei pelo Dog e uma latinha de fanta laranja e sentei-me num banco da praça Bento Gonçalves no centro. Estava saboreando aquela bomba calórica quando percebo que tem algo estranho no ar (e não é a maionese). Noto olhares em minha direção de uns sujeitos mal-encarados... Observando atentamente, percebo que dois deles eu vi na redenção hoje pela tarde... E olhando mais atentamente eu reconheci um deles, ele era um dos marginais que molestavam Aline naquela noite.
Com certeza ele queria se vingar daquela noite. Notei que estava em enrascada, pois ao redor dele já havia mais três e pelo jeito outros mais viriam para a festa. Como se não tivesse notado, acabei meu dog e sai bebendo a lata, com os sentidos todos voltados para o grupo deles, que notando meu movimento começaram a se mover também. Meu coração disparava, nunca fugi de uma briga, mas sabia que em maior quantidade eles poderiam acabar comigo facilmente, isso sem falar que com certeza os covardes deviam estar armados. Sem aumentar o passo, decidi que iria para um local com maior movimento, na esperança de ver algum brigadiano – Engraçado como sempre tem um policial quando nada esta acontecendo, mas quando mais precisamos, eles se desfazem no ar.
Dei uma ligeira apressada no passo, e percebi que eles iam me acompanhando. Tomei um caminho com muitas pessoas na rua. Nisso, inevitavelmente eles começam a gritar:
_Ta com medinho herói? Lembra de mim?
Eu percebi que já não adiantava mais tentar fugir, seja lá o que iria acontecer, eu teria de encarar e sofrer as conseqüências. Parei, fiquei uns 3 segundos olhando pro chão, me virei e disse.
_Acho que sim, mas da última vez eu tava bêbado e você parecia ser mais bonito.
Notei uma certa irá no olhar dele, os amigos deles queriam avançar para cima de mim, mas com um gesto ele segurou todos – muito mais fortes que ele por sinal. Ele se pos a rir e apontou para mim.
_Você tem coragem herói, devo confessar que admiro isso.
Tentei visualizar a situação. Estávamos próximos a ponte do Guaíba, perto da estrada com carros passando, as pessoas estavam com pressa e nem iriam ligar pra um espancamento. Eles estavam a cerca de uns cinco metros de mim, eu sabia que se tentasse correr preá onde quer q fosse eles iriam me alcançar rapidamente. O negócio era tentar ir levando e improvisando conforme o decorrer da situação.
_Lembra daquele meu amigo que você bateu com o cano – disse ele com uma cara de revolta, franzindo sua testa enorme e seu bigode fininho - , eu levei ele para o hospital, mas ele está em coma agora, e a culpa é sua!
_Minha? Desculpe amigo, mas vocês não podem sair estuprando garotas por ai e achar que nada vai acontecer.
Ele começou olhou para os lados, sem crer que eu estava falando aquilo, então disse:
_Espero que tenha comido aquela vaca da Aline, pois agora você não vai comer mais ninguém.
Peraí! Ele conhecia a Aline? Se ele sabe o nome dela, é porque ela não era uma vítima ocasional aquele dia... Bem, agora não era hora pra me preocupar com ela, e sim comigo mesmo.
_E você acha que me matando vai conseguir que seu amigo volte do coma?
_Quem disse que eu quero te matar? Galera, eu falei em algum momento que iria matar ele – os outros disseram não com ironia nas faces - .Eu acho que morte é algo chato, gosto de sofrimento sabe? Eu quero deixar você em coma sofrendo como meu amigo esta agora, infelizmente você pode morrer no processo...Mas é um risco que eu quero correr. He! He! He!
Ele fez um sinal, e eles começaram a rir e andar na minha direção...
_Caso você morra – disse ele – quero que lembre do meu nome seu desgraçado. Fala pro diabo que quem te matou foi o Jacaré.
Fui recuando, pensando em talvez correr entre os carros mas era arriscado, via apenas as luzes cruzando em alta velocidade na pista. Eu seria atropelado rapidamente, mas não conseguia pensar em nada melhor que isso. Notei que a gangue começou a tirar pedaços de pau e facas para acabarem comigo. De fato, estava fadado a um triste fim.
Comecei a dar passos perdidos de costas... numa situação destas se sabe que o fim é evidente, a cada segundo eles iam chegando mais perto, e aumentado sua velocidade. Quando era quase inevitável o primeiro golpe, um carro surgiu rapidamente do meio dos outros na rua, acertou dois dos malandros que caíram no chão. Separando eles de mim, o carro abre a porta para meu lado e um sujeito baixinho de cabelos grisalhos nas laterais grita:
_ENTRA LOGO NO CARRO!
Eu nem pensei duas vezes, me atirei no carro daquele cara. Não fazia a mínima idéia de quem era, mas naquele momento era minha tábua de salvação. Assim que entrei, os caras da gangue começaram a atirar coisas no carro e gritar coisas que nem fiz questão de prestar a atenção. O carro disparou se enfiando no meio do transito, entramos na ponte do Guaíba, olhei no meu relógio e faltava um minuto para meia-noite. Já comecei a me sentir seguro, apesar da respiração ofegante. Olhei para o senhor no carro e perguntei:
_Por que está fazendo isso? Foi arriscado!
_Eu vi eles avançando pra te atacarem e achei covardia...
BLAM!

Um tiro certeiro atinge a cabaça do velho. Espalhando sangue e miolos pelo volante e toda frente do carro. Eu em primeiro plano fico assustado, e com o carro já desgovernado tento assumir a direção – inutilmente.

Os carros se aglomeram em alta velocidade, causando um grande acidente, fazendo nosso carro ser jogado da ponte do Guaíba.

Dentro d’água, eu tenho dificuldades de sair de dentro do carro, sentindo o ar se esvaindo de meus pulmões dando lugar à água... Eu sentia a vida se esvaindo de meu corpo...

Comecei a ouvir um som, como uma música clássica. Conforme cada um dos meus sentidos me abandonava... Esta música era a única coisa que conseguia sentir...

segunda-feira, 2 de março de 2009

12

Redenção
O Parque Farroupilha, mais conhecido como Parque da Redenção, se localiza no centro da cidade, próximo da UFRGS. É um local aberto, onde a cor verde predomina por todo o território, contratando com o cinza dos prédios e o azul do céu. Uma área muito grande, com parque de diversão, quadras de esporte e vários lugares onde você pode encontrar uma boa sombra pra descansar.
Sempre gostei muito deste lugar, vinha muito com amigos jogar peteca. Vim algumas vezes no domingo, onde fica cheio de verdade. Aos domingos tem o Brick da Redenção, onde você pode encontrar de tudo. Perto do arco da redenção, acontece uma grande concentração de adolescentes. Aparece todo o tipo de pessoa, tecnicamente é um território livre e neutro, onde as pessoas podem ser o que elas quiserem. Gays, lésbicas, emos, punks, góticos, otakus e todo o tipo de conceito que você possa imaginar interagindo num ambiente em que ninguém os julga.
Eu havia entrado e passado pela área do zoológico, onde encontrei muitos gatos reunidos junto às árvores , alguns passaram na minha frente enquanto outros apenas me observavam atentos, como se esperassem alguma reação contra eles, seus olhos brilhantes em minha direção. Cheguei à área aberta e me dirigi até próximo do grande arco da redenção. Passei por um homem muito magro sentado em um canto. Aquele homem fazia a palavra fome sair do abstrato pro concreto – pessoas de rua sempre me comovem, afinal não sei o que levou este homem a este estado (normalmente é mulher). Como era dia de semana, havia poucas pessoas ali, muitas pessoas correndo e fazendo exercícios, outras apenas cruzando para chegar em outro destino. Observei dois caras mal encarados...um era meio gordo, enquanto o outro mais franzino....este último me era familiar, mas não quis me lembrar de familiaridade com marginais...
A redenção é perto de onde moro, mas fazia um tempo que não a visitava. Da última vez havia vindo com a Domi e alguns amigos. Foi um domingo lotado, onde presenciamos cenas como um garoto ser assaltado e uma garota sentada no banco lendo livro de saia, e sem calcinha - pra todo mundo ver. Naquele tempo estávamos bem, foi um dia muito divertido...acho que o último realmente divertido da nossa relação. O sol estava para se pôr, mas queria ver o pôr do sol em outro lugar, então comprei um cachorro quente numa carrocinha e uma latinha de refrigerante e me larguei – antes pensei em dar um cachorro quente ao homem magro, mas ele já não estava mais lá... Fui notando que em alguns cantos pelo caminho, havia uns caras mal encarados parados e me olhando... Eles não estavam perto de mim, mas sentia no olhar deles alguma intenção ruim...porém não liguei...cara feia pra mim e fome...
Se eu tivesse me antenado...talvez o fim deste dia pudesse ser um pouco diferente...

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

11

Um dia de sol.
Durante aquela tarde quis esquecer todos os meus problemas, dar um tempo para mim mesmo. Naquele momento, eu consegui esquecer de toda a agitação e da bagunça que rondava minha cabeça. Esqueci de todo o turbilhão de acontecimentos que surgiram do nada.
Decidi dar uma volta na cidade, pelo centro de Porto Alegre mesmo. Comprei uma casquinha de sorvete, e caminhei até a Usina do Gasômetro. Esta cidade tem muitos museus e várias coisas de relevância culturais, como peças de teatro. Eu vivo prometendo pra mim mesmo que um dia vou fazer um passeio cultural em todos eles...mas sempre acabo procrastinando. Eu curto muito a Usina do Gasômetro, da pra se ter uma boa vista do Guaíba, a arquitetura me parece rústica... Eu não entendo dessas coisas, mas acho um lugar muito agradável. Subi até o telhado, havia poucas pessoas. Acomodei-me encima de uma parte mais alta e inclinada... Algumas pessoas me olhavam de maneira estranha, mas tudo bem. Eu sempre vinha aqui com a Domi nos fins de semana.
Deitei e comecei a olhar o céu... Sempre gostei de lugares altos, era como se estivesse mais perto das nuvens e meus pensamentos pudessem fugir da Terra. Olhei meu celular... Fui ligar para meu amigo Douglas, mas lembrei q ele estava indo ao casamento de um amigo dele mestre de Kung-Fu chamado Michel. Fui ligar pra uma amiga minha chamada Gaby, mas lembrei que ela havia feito uma viagem, pensei na Aline, mas queria dar um tempo após o beijo, a Domi... Não. Enfim, creio que as pessoas a qual eu poderia recorrer não estão disponíveis. Fechei meus olhos, podendo assim sentir melhor o vento bater em meus ouvidos, vindo com o som da cidade.
De olhos fechados... Senti aos poucos a presença de alguém se aproximando... Sentia aquela sensação de presença que sentimos quando estamos dormindo e alguém quer nos acordar, e cada vez ficava mais próxima... Um mal-estar percorria meu corpo, como se meu estomago tivesse despencado até o chão... Surgiu em minha mente aquela figura de manto negro que surgia em meus sonhos... Era como se fosse receber seu toque, e algo me tocou – Dei um sobressalto!

_Com licença, mas o senhor não pode ficar ai encima – Disse um guardinha do local, esforçando-se para ser simpático - Por favor, desça.
_Opa! foi mal...
Desci meio atordoado, de fato havia tomado um grande susto, sai dali sob o olhar desconfiado do guardinha e o olhar de desaprovação das outras pessoas. Era melhor eu ir pra outro lugar e continuar aproveitando este dia de sol.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

10

Preto, com listras prateadas e amortecedor de impacto.
É incrível como os tênis andam caros hoje em dia. Eu não queria pagar um tênis muito caro, o máximo seria cinqüenta reais, porém Aline insistiu de forma infantil em completar o dinheiro e pegar um tênis mais pomposo – Ela disse que me devia por ter salvado ela aquele dia.
_Então, vamos comer algo agora? – disse ela.
_Vamos nessa!
Saímos da loja e mergulhamos mais uma vez no mar de pessoas. Deixei que ela guiasse nossos passos, pois eu estava sem idéia de um bom lugar para comer. Acabamos chegando no shopping da Rua da Praia, fomos até a praça de alimentação. Eu sempre achei a praça de alimentação deste shopping estranha, pois é quase como entrar num portal dimensional. Eu demorei pra perceber que ali tinha uma área tão grande.
_Hoje quero comer comida de verdade – disse ela – Aqui tem um lugar ótimo...
Fiquei surpreso! quando sentamos à mesa, o prato dela se equiparava ao meu. Era praticamente um “morrinho”, nunca imaginei que uma garota magrinha e bonitinha como ela comece tanto, pra onde vai tudo isso? Será que ela tem uma perna oca?
_Sabe Arthur, quando você foi lá em casa, eu percebi que você tem uma tatuagem que pega teu peito e da volta nas costas...é algo escrito mas não consegui entender, o que é? – Ela indagou antes de dar uma bela garfada no seu purê.
_É uma frase em latim, “Crudelius est quam mori semper mortem timere”, que significa “Temer a morte é morrer duas vezes”.
_Nossa, frase bem forte esta, por que escolheu ela?
_É estranho – engoli o que comia – Eu nunca tive medo da morte, dês de pequeno sabe. Eu vejo como apenas mais uma fase da vida, é algo inevitável que acontece com tudo aquilo que vive.
_Uau! – diz ela após um gole de suco de laranja – Que profundo! Eu não sou assim, tenho medo da morte, de deixar as pessoas que eu amo e que me amam...
Ela foi baixando a voz e desviando o olhar no meio da frase. Acho que ela lembrou de alguma coisa ou alguém. Era melhor eu mudar de assunto.
_Hum...Mas a comida daqui é muito gostosa mesmo hein....
_Você gostou? – Ela abriu um sorriso novamente – Eu venho aqui com freqüência até. Meus amigos sempre dizem que eu como demais e que não engordo de ruim mesmo, hi!hi!hi!hi!

Aos poucos fui criando uma afinidade maior com Aline. Eu gostava da companhia dela, me deixava feliz. Ela era tão meiga quando sorria, e eu sentia um instinto de protegê-la de tudo, como se precisasse estar perto dela para não fazer ela passar por nada de mal outra vez – Acho que comecei a ver algo a mais nela...
Eu antes estava com o coração fechado, sentia como se não pudesse ser feliz com mais ninguém....mas estranhamente, algo esta germinando neste terreno infértil, sinto que uma pequena folha conseguiu romper o solo. Não é anda demais, mas consegui perceber que posso sentir algo por mais alguém além do que senti pela Domi. O que sinto por ela ainda existe, mas este sentimento já esta abrindo concessão para que algum outro tome o seu lugar.

Já passava das 14h, eu precisava fazer outras coisas ainda neste dia. Nós andávamos na casa de cultura Mário Quintana, no jardim.
_Aline, eu preciso ir agora, tenho que organizar algumas coisas que estão fora de si na minha vida.
_Ah! Sério? Você não pode ficar nem mais um pouquinho? – disse ela com olhar de cão pidão.
-Sério, bem que eu gostaria, mas se eu enrolar mais, vai virar uma grande bola de neve e...

Num súbito e repentino movimento que fugiu dos meus olhos, ela me desferiu um beijo na boca.

_Bem...então boa sorte, agente se fala...
E como uma lebre ela disparou correndo dali com a face avermelhada como o tomate mais maduro de verão. Ela saiu deixando no ar um rastro de pequenas risadas contidas.
Confesso que fiquei pasmo ali, parado. Sabia que ela estava afim de mim, mas não esperava uma atitude tão repentina assim – Confesso que gostei...mas agora eu tinha que ir, o dia ainda tinha que render bastante pra mim por tudo no seu devido lugar...

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

9

Isto estava parecendo um encontro.
Aline falava bastante, me puxava pela mão enquanto nós andávamos pelas movimentadas ruas do centro de Porto Alegre. Ela falava tão alto que conseguia distinguir a voz dela no meio de todas as pessoas. Notava que ela estava sorrindo bem alegre...mas sentia como se ela usasse isso como um escudo, uma máscara, era como se ela estivesse escondendo algo com toda aquela alegria.
Os tênis que ela havia me dado eram extremamente desconfortáveis. Pelo buraco do calcanhar conseguia sentir cada pedra que pisava, se pisasse em uma moeda saberia a sua face. Diz-se que se conhece um homem pelo sapato que usa, então de pés descalços eu teria mais caráter. As pessoas na cidade grande não costumam olhar para quem esta ao redor, sempre estão com muita pressa para isso – Mas eu senti muitas caretas em direção a mim e meu tênis. Quando comprarmos o tênis novo irei botar fogo neste, estarei fazendo um favor aos pés da humanidade.
Era dia de semana, a cidade estava lotada!!! Mas Aline sabia como se mover de uma maneira que driblava a todos, era como se ela estivesse nadando em meio a milhares de corpos. Em meio a tantas pessoas....eu vi passar por mim a garota triste do meu sonho...reconheci de imediato, ela não olhou para mim, mas pude reconhecer seu olhar triste. Me virei para Aline, desvencilhei-me de sua mão.
_Aline, espera um pouco...
Me virei e sai a procurá-la, Olhava em cada rosto e em cada pessoa...Mas ela não estava ali, era como se tivesse sido tragada pela multidão e desaparecido sem deixar vestígios.
_O que foi Arthur? Você está bem – disse Aline preocupada.
_Ah? Sim....É que meu tênis tinha escapado do pé, daí fui pegar devolta.
_Tome mais cuidado. Você não se importa se comermos algo antes de comprarmos o tênis? Estou com uma fominha...
_Claro que não – Na verdade me importava sim, compraria até tamanco escocês pra me livrar daqueles malditos tênis – onde vamos comer?
Enquanto nos desviávamos entre as pessoas para comer, eu refletia sobre a tal garota que eu vi. Será que estou ficando louco? Começava a ver esta garota em toda a parte...Era muito real pra ser apenas imaginação...
_Você está bem? – Pediu Aline, que havia nos carregado até uma área com menos pessoas – Parece que está com a cabeça longe...
_Não, que nada, só estava pensando nas aulas que perdi no cursinho.
_Eu sei o que é, você quer comprar o tênis primeiro né? Vamos lá então.
É, até que ela era esperta.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

8

Decidi re-começar.
O dia estava recém começando, e eu tinha muita coisa pra organizar na minha vida. Decidi começar pela minha própria casa em si. Meu quarto estava tão desarrumado, como se eu tivesse contratado um profissional para deixá-lo assim. Nunca fui muito organizado, sempre gostei de deixar a vista as coisas que eu estivesse usando no momento, não importa onde fosse. Minha mãe ficava louca com isso.
Não é que o celular toca, e pelo toque vejo que é minha mãe:
_Alô mãe.
_Oi Anjo, como você esta?
_Estou bem, aconteceu alguma coisa?
_Não, é que você não me ligou, fiquei preocupada.
Ela tinha razão, eu costumava ligar uma vez por semana pra casa sempre, e andei tão desnorteado com meu caso com a Domi que acabei esquecendo.
_Está tudo bem mãe, eu só andei meio ocupado com algumas coisas aqui, não se preocupe.
_Filho, você sabe que a mamãe te ama né? – Notei um tom meio triste na voz dela, ela sempre se emocionava nas ligações mesmo.
_Claro mãe, eu também te amo, sabe disso. Olha, assim que der eu dou um pulo ai pra visitar vocês ok?
_Tudo bem Anjo, se cuida, mamãe te ama! Todo mundo aqui em casa ta te mandando um abraço!
_Outro abraço, amo vocês – Desliguei o telefone.
A relação com a minha família sempre foi tranqüila. Minha mãe era médica, ficava mais tempo envolvida nos assuntos do hospital do que em casa. Meu pai um respeitado fazendeiro e dono de muitas terras, conhecia o campo como a palma da mão. Minha irmã tinha treze anos, uma pré-adolescente padrão, com todas as complicações impostas pelas mudanças do corpo.
Não creio que eles sintam tanta falta de mim. Minha mãe se emociona a toa mesmo, eu acho que minha saída lá de casa foi melhor pra todo mundo. Pra mim por conseguir minha independência financeira, para eles por terem menos despesas com uma pessoa a mais na casa.

Fui até a janela, sempre gostei de observar o movimento da rua, por isso escolhei este apartamento pra morar. Olhei a mesma paisagem de sempre com seus elementos diferentes, carros passando, prédios altos no horizonte, pessoas apressadas nas ruas...Mas assim que tirei os olhos, algo me chamou a atenção. Tornei a olhar, mas não encontrei. Havia visto a garota de olhos tristes parada no meio da calçada, olhando diretamente para a minha janela. Deve ter sido impressão minha, afinal não tem nada ali.

O celular toca outra vez...desta vez não reconheci pelo toque – era Aline.
_Alô?
_Oi Arthur! Aqui é a Aline, lembra de mim? – Ela estava com uma voz encabulada, como uma pessoa respondendo uma pergunta de algum programa de rádio sem certeza da resposta.
_Claro que lembro! E ai, sendo atacada por muitos bandidos ainda? He!he!
_Hi! Hi! Hi! Não mais...mas gostaria de saber se podemos nos encontrar...desta vez sem precisar bater em ninguém, que tal?
_Bah! Mas assim vai perder um pouco da graça. Olha...dependendo do dia tudo bem, eu tenho algumas coisas pra organizar. Acredita que to sem calçado algum? Nem aqui em casa tenho.
_Hum...Sério? – Ela silenciou por alguns segundos – Eu acho que posso resolver teu caso, ao menos pra você poder sair pra rua. Me fala onde você mora?
Eu passei o meu endereço para Aline, acho que ela virá aqui, se fosse este o caso, era mais uma razão pra arrumar tudo. Não é sempre que tenho visitas na minha humilde residência. Mas ainda dava olhadas pela janela pra ver se enxergava a tala garota de olhos tristes...Pode ter sido impressão minha apenas...mas foi tão nítido. Pouco mais de duas horas eu recebo batidas na porta. Lá estava Aline. Vestia um vestido rosa, jaqueta jeans azul, botas marrons, seus cabelos loiros estavam soltos, e sua franja não cobria seus olhos castanhos que miravam em mim e brilhavam junto com seu sorriso. Quando abri a porta, ela me mostrou um par de tênis velhos, daqueles que já foram brancos e hoje são cinza-grafite, com a sola da frente descolada e um buraco no calcanhar.
_Não é grande coisa, mas ao menos podemos sair para comprar um par novo, vamos?
 
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